"As nossas comunidades precisam de energia, mas infelizmente a rede é demasiado cara e insuficiente. Nós usamos energia renovável porque é sustentável e acessível"- Sr. Davio Machava, Administrador do Governo Local de Zavala
A mandioca é considerada um dos principais alimentos básicos e desempenha um papel vital na segurança alimentar em Moçambique, tal como no resto de África. Moçambique é o 11º maior produtor de mandioca em África com mais de 100 variedades cultivadas nas diferentes partes do país.
A cooperativa Josina Machel no distrito de Inharrime, província de Inhambane, fundada em 1991, é a maior fábrica de processamento de mandioca em Moçambique. Atualmente a cooperativa usa métodos tradicionais não mecanizados de processamento para produzir "Rale", um produto final de farinha depois de ralar, desidratar, assar e secar a mandioca. O processamento da mandioca é trabalhoso e envolve o uso de grandes quantidades de lenha, o que é prejudicial ao meio ambiente. Além disso, as mulheres estão mais envolvidas não só em actividades de mão de obra intensiva, como descascar, secar, assar e transportar lenha, mas também em actividades que apresentam graves riscos para a saúde, como assar e secar utilizando lenha durante todo o dia. As mulheres estão expostas ao fumo da lenha, um dos principais contribuintes para a poluição por partículas finas (PM) e responsável pela má qualidade do ar.
Os baixos níveis de produtividade são mencionados como um dos principais obstáculos ao desenvolvimento da indústria de transformação da mandioca. Isto está associado ao fraco acesso à energia que afecta negativamente o lado da oferta da cadeia de valor da mandioca. Com o apoio da UNIDO, a cooperativa adoptará o biogás para melhorar o acesso à energia e atender às necessidades de processamento de mandioca da cooperativa e reduzir o impacto do consumo de lenha no meio ambiente
"Há necessidade de aumentar a produção para que as comunidades se possam sustentar e para aumentar a produção, há necessidade de energia sustentável"---Jaime Comiche, Representante da UNIDO em Moçambique
A UNIDO, em parceria com a CHARIS-Associação de Solidariedade Social, iniciou o processo de instalação de unidades de biogás simples e de baixo custo para uso doméstico e de pequenas empresas nas indústrias de coco, castanha de caju e mandioca na província de Inhambane, Moçambique. A Cooperativa de Processamento de Mandioca Josina Machel, no Distrito de Inharrime, é beneficiária do projeto UNIDO/GEF que tem como objetivo a produção de 35.000 m3 (cerca de 96 m3/dia) de biogás para utilização na cozinha (doméstica, pequenas, médias e grandes indústrias), refrigeração e iluminação)
Uma sistema de biogás, com uma capacidade de produção de 15m3 de biogás, será instalado na Unidade de Processamento de Mandioca da Cooperativa Josina Machel para reduzir os custos operacionais e aumentar a eficiência nas actividades de produção da Cooperativa. Na Unidade de Processamento, o biogás será transformado em energia eléctrica para alimentar os torradores de mandioca durante o processo de refinação.
De acordo com a Eletricidade de Moçambique (EDM), empresa estatal de energia que se ocupa da produção, distribuição e comercialização de eletricidade, em 2018 a taxa de eletrificação do país com energia da rede nacional era de 31%. Isto significa que o país terá de assegurar a restante cobertura nos próximos sete anos. Por outro lado, o acesso estatístico reportado pode não se refletir ao nível do utilizador final, uma vez que a pobreza é também um impedimento ao acesso à energia, mesmo quando esta já está disponível.
Na última década, as energias renováveis tornaram-se cada vez mais uma opção viável para aumentar o acesso à energia em muitos lugares, particularmente nas zonas rurais de Moçambique, e para promover usos produtivos no sector agrícola.
" Dado que o mandato da UNIDO se restringe a acções de cooperação técnico-normativa, temos promovido iniciativas consentâneas com a implementação do nosso mandato, que é promover a industrialização inclusiva e sustentável". -Sr. Jaime Comiche, representante da UNIDO em Moçambique
Aqui estão as 7 intervenções da ONUDI em promoção do SDG 7 "em Moçambique;
1. Implementação e demonstração de centrais mini-hídricas nas províncias de Niassa e Zambézia com a capacidade total de 3.5MW (2012)
2. Produção Mais Limpa e Eficiência de Recursos (2012-16), com enfoque na descarbonização e eficiência do uso de energia em unidades produtivas da cadeia de valor da hotelaria e hospitalidade.
3. Implementação do projeto "Towards Sustainable Energy For All In Mozambique (TSE4ALL-M): promover a disseminação baseada no mercado de sistemas integrados de energias renováveis para usos produtivos nas zonas rurais", que visa, entre outros resultados, demonstrar a viabilidade técnica e comercial dos sistemas de energias renováveis no sector produtivo, incluindo a agricultura e a indústria agroalimentar
4. Promover o apoio técnico e regulamentar ao governo, às empresas ou associações de produtores e ao meio académico, permitindo o acesso ao conhecimento, à tecnologia e ao financiamento adequados para alcançar o ODS 7, com ênfase no acesso à energia sustentável para fins produtivos.
5. Adaptar, testar e demonstrar soluções tecnológicas ou regulatórias para o acesso à energia para fins produtivos, ou eficiência energética, para que possam ser adoptadas e replicadas no país.
6. Apoiar as instituições nacionais na defesa dos interesses da agenda de desenvolvimento nacional e setorial nos fóruns globais, por exemplo: A UNIDO em Moçambique facilitou os passos decisivos para inserir na "Declaração de Maputo, dos Ministros da Energia da U.A. (05 de novembro de 2010)", a proposta de submeter à AG da ONU, a adoção do ano 2012 como o "Ano Internacional do Acesso Universal à Energia";
7. Entre 2012 e 2013, a UNIDO liderou, em nome da ONU, as diligências para que o Governo de Moçambique formalizasse a adesão ao mecanismo de energia sustentável para todos (SE4ALL)
Derivado de uma entrevista com o representante da ONUDI, Sr. Jaime Comiche, realizada pela RTP África. Veja a entrevista completa AQUI
O biogás é uma forma de energia renovável que depende de microrganismos que convertem a matéria orgânica fermentável num gás combustível e estrume orgânico amadurecido. É um subproduto da decomposição anaeróbica da matéria orgânica, incluindo resíduos vegetais e animais, resíduos orgânicos de processos industriais (de matadouros, conservas alimentares, sumos de fruta e produção de leite), resíduos biológicos domésticos, águas residuais e culturas agrícolas.
De acordo com o Ministério da Energia, Moçambique é dotado de vastos recursos de biomassa para a produção de electricidade, incluindo resíduos de mais de 1,7 milhões de hectares de plantações florestais, resíduos industriais e agro-industriais, resíduos de indústrias transformadoras de madeira e materiais vegetais, e resíduos da folhagem da cana-de-açúcar provenientes de uma área total de plantação de mais de 40.000 hectares. Não obstante os enormes recursos, Moçambique continua a debater-se com desafios no que diz respeito à adopção da tecnologia do biogás.
O TSE4ALL-M interagiu com o Prof. António Cumbane, um renomado fornecedor de tecnologia de biogás e fundador da Engenharia de Processos Ambiente, Consultoria e Servicos (EPACS) Lda e aqui está o que ele tinha a dizer sobre o desenvolvimento da tecnologia de biogás em Moçambique
TSE4ALLM: Fale brevemente sobre a aplicação da tecnologia do biogás em Moçambique
AC: A investigação e aplicação do biogás é ainda muito escassa em Moçambique, apesar da existência de abundantes resíduos animais e vegetais e também em áreas urbanas com muitos resíduos alimentares que podem ser utilizados como matéria-prima para a produção de biogás.
TSE4ALLM: Porque é que as zonas rurais são lentas na adopção do biogás?
AC: As nossas comunidades não estão sensibilizadas para a aplicação da tecnologia. Um dos principais desafios é a separação dos resíduos. Quando se separam os resíduos, aumenta-se o seu valor para serem utilizados como matéria-prima. O desafio, especialmente nas zonas rurais, é como permitir que as comunidades separem as matérias-primas sem as misturar com areia/solo, uma vez misturadas com o solo, perdem valor.
TSE4ALLM: Quais são as oportunidades para a tecnologia do biogás em Moçambique?
AC: Existem muitas oportunidades para o desenvolvimento da tecnologia do biogás em Moçambique, dado o facto de a economia moçambicana depender predominantemente da agricultura, onde são produzidos muitos resíduos através dos animais (vacas, porcos, etc.) e das plantas.
TSE4ALLM: Que matéria-prima é mais adequada para a tecnologia de biogás em Moçambique?
AC: A fonte mais conveniente de matéria-prima é o suíno, uma vez que é criado num ambiente mais confinado e podemos obter 100% dos seus dejectos, ao contrário de outros animais que se deslocam de um lugar para outro enquanto pastam. No caso do estrume das vacas, durante o dia elas saem e voltam para um estado confinado, o que é um pouco difícil de obter estrume considerável para a matéria-prima. Também temos resíduos vegetais, por exemplo, de vegetais e cana-de-açúcar. No entanto, o desafio reside na falta de indústrias competentes para processar estes resíduos
TSE4ALLM: Quais são os pré-requisitos para escolher uma central de biogás?
AC: Em primeiro lugar, é necessário ter em conta a matéria-prima necessária para a unidade e a quantidade da mesma, qual a quantidade disponível?
TSE4ALLM: Como tornar a tecnologia do biogás acessível às comunidades rurais?
AC: Na maioria dos casos, o equipamento necessário para a tecnologia do biogás é importado e o seu custo é elevado, mas isso não significa que o equipamento não possa ser fabricado localmente para satisfazer as necessidades locais, especialmente nas zonas rurais. A adaptação da tecnologia é feita, por exemplo, para filtrar garrafas que podem ser adaptadas com o objectivo de garantir que o gás possa entrar e sair, onde a água pode ser separada do gás, o algodão também pode ser usado para filtrar a água. Pode ser utilizada uma mistura de ferro e carvão. Não é necessário importar tudo. Os materiais locais podem ser utilizados
TSE4ALLM: Quais são os benefícios socioeconómicos da tecnologia do biogás?
AC: O biogás pode melhorar o bem-estar das comunidades porque é uma tecnologia amiga do ambiente e promove um ambiente limpo para cozinhar. Do ponto de vista económico, é essencial porque pode reduzir o custo da energia utilizada, uma vez que também pode ser convertido em electricidade.
TSE4ALLM: Como podemos garantir um planeamento e implementação eficazes dos projectos de biogás em Moçambique?
AC: Precisamos de ter todas as partes interessadas envolvidas; pessoas formadas para a manutenção. A manutenção é um grande desafio, não se pode simplesmente entregar o projecto a qualquer pessoa. É necessário formar as pessoas que irão gerir o funcionamento quotidiano da tecnologia. É sempre importante manter o contacto com os especialistas para informar sobre quaisquer problemas detectados ao longo do percurso.
A sensibilização para a utilização e os benefícios é a solução para incentivar as comunidades a adaptarem as tecnologias renováveis
O monitoramento da alimentação também é necessário para evitar qualquer infiltração da areia. A areia pode bloquear o gás nos biodigestores. É importante que a matéria-prima seja limpa. A quantidade de orgânicos no gás pode influenciar a qualidade.
TSE4ALLM: Como é feita a limpeza do biodigestor?
AC: Há a limpeza do biodigestor e a limpeza da matéria-prima. Para a matéria-prima, é preciso garantir que as comunidades adotem currais cimentados e limpem os resíduos em caso de vazamentos. Para o biodigestor, é importante limpar tanto a entrada quanto a saída.
TSE4ALLM: Qual é o futuro da tecnologia do biogás em Moçambique?
AC: Há necessidade de políticas que promovam a tecnologia. O governo precisa de promover a tecnologia, mas o sector privado precisa de participar para a massificação da tecnologia.É necessário sensibilizar as comunidades sobre as vantagens e a aplicação da tecnologia do biogás
O workshop de divulgação do BCI-SUPER sobre "Financiamento das PMEs e a linha de crédito BCI-SUPER: Preparação de Projectos Bancáveis", organizado pela ONIDO em parceria com BCI e o FUNAE, teve como objetivo reforçar as capacidades dos participantes de instituições financeiras envolvidas na avaliação técnica ou financeira de propostas de projectos para implementar sistemas integrados de energias renováveis nas zonas rurais em Moçambique.
Aqui estão as principais lições do workshop;
1.Os promotores de projectos precisam de orientação para a instalação de sistemas, bem como de padrões de qualidade de acordo com a tecnologia utilizada;
2.É necessário criar incentivos fiscais específicos para promover parcerias internacionais e encorajar a importação de equipamento de energias renováveis;
3.São ainda muito necessárias intervenções específicas para reforçar as capacidades e sensibilizar as partes interessadas para a relevância e utilidade das tecnologias das energias renováveis;
4.As PMEs precisam de melhorar a sua literacia financeira para compreenderem os benefícios do sector formal, em particular eliminando ideias erradas sobre a conformidade fiscal e financeira;
5.Todas as partes interessadas ao longo do ciclo de vida do instrumento financeiro devem ter o mesmo nível de compreensão e ser capazes de utilizar a mesma abordagem durante a preparação, avaliação e apresentação de relatórios dos projectos;
6.A capacidade técnica dos fornecedores de tecnologias e serviços no domínio das energias renováveis tem de ser reforçada, a fim de permitir a criação de sistemas funcionais e sólidos;
7.O papel dos fornecedores de tecnologias e serviços no domínio das energias renováveis deve ser reforçado, permitindo-lhes conceber intervenções inovadoras e com impacto. Devem ser disponibilizados mecanismos de atenuação dos riscos a este grupo específico, a fim de facilitar o acesso ao financiamento, às tecnologias e ao saber-fazer;
8.O mercado necessita de mecanismos financeiros inovadores adicionais, que combinem diferentes tipos de fundos e diferentes competências para fornecer ao mercado produtos atractivos e a preços acessíveis;
9.A maioria dos projectos utiliza a tecnologia solar fotovoltaica. Embora este facto seja positivo e relevante, a participação das PME em sistemas de produção de energia a partir de outras fontes, incluindo resíduos orgânicos (procura e oferta), é comparativamente menor;
10.O desenvolvimento local de soluções relevantes (em particular sistemas W2E-Biogas) deve ser uma prioridade para reduzir os custos e aumentar a confiança do mercado em sistemas de energia renovável, que serão então fornecidos e mantidos localmente;
11.É necessário que mais empresas sociais actuem como intermediários honestos entre as comunidades e os fornecedores de tecnologia, cultivem novas relações sociais e incentivem as comunidades a adotar e utilizar sistemas de energia mais limpos. A combinação de empresas sociais e fornecedores de energias renováveis pode catalisar a mudança e promover o desenvolvimento económico e social sustentável.
De acordo com o Relatório Global da Água, em Julho de 2020, a cobertura dos serviços de abastecimento de água em Moçambique era de 56%, com uma disparidade significativa entre a cobertura dos serviços de água urbanos e rurais. Enquanto 84% das áreas urbanas têm acesso a serviços de abastecimento de água, apenas 40% das áreas rurais estão cobertas. Deste modo, o país está ainda distante de alcançar o ODS 6 "Garantir o acesso à água e ao saneamento para todos".
Apesar dos progressos consideráveis registados nos últimos 20 anos, os níveis de cobertura dos serviços de água têm sido lentos devido ao rápido crescimento populacional de 13,6 milhões de pessoas em 1990 para 31,2 milhões em 2020 e às elevadas taxas de urbanização. O Governo de Moçambique estima que são necessários pelo menos 4,2 mil milhões de dólares para atingir o objectivo de acesso universal aos serviços de água até 2030. O investimento público insuficiente no sector resultou numa cobertura limitada dos serviços públicos, especialmente nas zonas periurbanas e rurais. Perante este facto, surgiram fornecedores de água de pequena escala (FPA) para preencher a lacuna e a sua existência foi formalizada pelo decreto 51/2015 aprovado pelo GdM.
Ao longo do tempo, estas empresas familiares cresceram em número e dimensão com a expansão para pequenas cidades e zonas rurais, fornecendo água para beber, higiene, actividades comerciais e produtivas. De acordo com a USAID, os pequenos fornecedores de serviços de água representavam 22,7% do abastecimento de água nas zonas urbanas, o equivalente a 1,76 milhões de pessoas em 2018
Não obstante o papel sem precedentes do fornecedor privado de água, o sector debate-se com elevados custos de electricidade na sequência do aumento das tarifas em 2018 pela entidade nacional de electricidade - EDM. Estima-se que os custos de electricidade representem 35% a 65% dos custos operacionais dos prestadores de serviços de água. Em 2021, a EDM aumentou a tarifa em 10%, numa tentativa de melhorar a sustentabilidade financeira das suas operações. Além dos elevados custos da electricidade, os fornecedores privados de serviços de abastecimento de água sofrem interrupções repetidas e por vezes prolongadas dos serviços de electricidade, o que dificulta o abastecimento aos seus clientes. Esta situação é agravada pela má qualidade da energia eléctrica, que frequentemente danifica de forma prematura o motor da bomba de água, cuja substituição é muito dispendiosa.
Tendo em conta os desafios acima referidos e a necessidade de melhorar a cobertura dos serviços de abastecimento de água, a Associação Moçambicana de Prestadores Privados de Serviços de Água recorreu à adopção de sistemas solares como alternativa viável. Em Janeiro de 2023, a associação embarcou na instalação de sistemas solares para cada um dos 9 fornecedores privados de água identificados, localizados em vários locais na província de Maputo, totalizando 63 Kw de capacidade combinada.
A adopção de sistemas solares traz enormes benefícios para o ambiente e para os provedores de serviços, uma vez que contribui significativamente para reduções na emissão de GEE para fornecedores de água que actualmente usam geradores a diesel. Os fornecedores ficarão também menos sujeitos a variações imprevisíveis dos preços do combustível que afectam a sua rentabilidade.
"Ao confiar na energia solar como fonte primária de energia para operar os seus sistemas, os FPAs serão menos vulneráveis aos efeitos dos frequentes cortes e flutuações no fornecimento de energia que actualmente levam a maus serviços ao cliente e danos no equipamento"--- Sr. Adriano Chirute, Presidente, AFORAMO